quarta-feira, 12 de junho de 2024

A puta e a santa

 

Contém spoilers de Sex and the City, só avisando (T. 3, Ep. 16)


Não sei se você já assistiu Sex and the City - eu lembro de assistir alguns episódios quando era bem novinha (será se fui influenciada pela Samantha, sim ou com certeza?) e estou achando interessantíssimo assistir agora, com um olhar adulto e problematizador, é claro.

Hoje vamos falar sobre como nossa sociedade separa as mulheres em “pra casar”e “pra transar” e por que isso é um problema.

Estou na parte em que a Charlotte acabou de se casar com o Trey. Pra quem não sabe, a Charlotte é a “boazinha” (chatíssima) do grupo. A que sempre sonhou em se casar, ter uma família margarina, não fala palavrão e é a primeira a julgar qualquer comportamento liberal como vulgar. Só que essa princesa se casou com um broxa. E de repente o sexo passou a ser importante em sua vida.

Ela tentou todas as técnicas de sedução, empenhada em fazer a pipa subir. Tentou conversar sobre o assunto com o marido, enquanto ele sempre se esquivava do assunto, atribuindo zero importância à sua própria paumolescência.

Meses de tesão acumulado se passaram para a Charlotte, até que numa noite ela acordou com sons estranhos vindo do banheiro. Os grunhidos eram, nada mais, nada menos, do que seu marido se masturbando com a revista Peitões.

Boa notícia: o negócio funciona.

Má notícia: continua não funcionando com ela.

Como proceder?

Confesso que, no momento em que escrevo este texto, ainda não assisti o próximo episódio, então realmente não sei o que acontece. Maaas tenho meu palpite, principalmente com base em algo que o próprio Trey falou.

Em determinado momento, Charlotte decidiu buscar ajuda profissional e os dois vão juntos para terapia de casal. Como lição de casa, ambos foram orientados a deitar lado a lado e compartilhar com o outro uma fantasia sexual. Charlotte tomou a iniciativa e narrou sua fantasia, a qual podemos chamar de fantasia em todos os sentidos, pois descreveu a si mesma como uma fada princesa montada num unicórnio (insuportável, eu sei). Trey se mostrou incomodadíssimo com isso, não conseguiu compartilhar sua fantasia e, olha só, chamou sua esposa de “princesa”.

Há algo que acontece em relacionamentos, principalmente quando há muita pressão para performar papéis sociais impecáveis: a dificuldade em enxergar a mulher como… mulher! No sentido de fêmea, no sentido erótico da coisa.

Às vezes essa dificuldade parte da própria mulher, especialmente após uma gestação, quando olha para si e não consegue se encontrar. Às vezes, parte do parceiro, que ao enxergar a esposa como “mãe de seus filhos” esquece de como aqueles filhos foram gerados, para começo de conversa.

O nosso estudo de caso de hoje é um pouco mais raro, mas acontece. Trey é um homem com dificuldade para integrar o seu lado social, de homem bem sucedido, bem casado e, de certa forma, bem romântico, com seu lado erótico e instintivo. É como se seu desejo fosse muito feio e sujo, não combinasse com sua vida imaculada. Muito menos com sua esposa imaculada. O erotismo e o romantismo estão completamente separados em sua vida.

Numa outra fala com o terapeuta, ele explica que aquilo (a punheta) foi só para liberar a tensão, “não tem nada a ver com a Charlotte”. Como você já sabe, por aqui somos completamente a favor da masturbação, porém se há muito treino e nenhum jogo, isso pode indicar um problema.

Os nossos desejos não são bonitos. Teimosos, se recusam a seguir normas sociais. Não podemos escolher o que nos deixa com tesão, nossa tarefa é integrar e explorar nossas vontades, dentro dos limites de consensualidade dos envolvidos, é claro. Nem sempre é uma tarefa fácil. E sem comunicação é impossível.

Ao invés de se abrir com a esposa, Trey prefere se esquivar e se masturbar escondido. E eu entendo, de verdade, provavelmente nem ele mesmo compreende o que há de errado; sem informação e repertório, ainda mais quando falamos de gerações anteriores à nossa, não há como assimilar essa contradição, muito menos como expressá-la.

Ainda assim, temos uma esposa que, apesar de considerar o sexo secundário numa relação, está insatisfeita e com vontade de vivenciar sua sexualidade ao lado do homem que escolheu. Para tanto, Trey precisará estar aberto a incluir sua esposa em sua vida sexual. Talvez Charlotte possa ajudar, assumindo uma persona diferente na cama, só que isso também depende do Trey se abrir mais acerca do que desperta o seu desejo. E depende da Charlotte estar disposta a expandir seu repertório erótico… E na real talvez tudo se resolva se a Charlotte colocar silicone.

Brincadeira, não acho que um silicone seja capaz de resolver tudo, a única certeza que eu tenho é que esse casal precisa deixar de lado algumas crenças e expandir os seus conceitos.

Vamos aguardar os próximos episódios! Até lá, fica a minha recomendação para você integrar os seus desejos, até os mais estranhos, na sua vida conjugal. E recomendo assistir Sex and the City também, para eu ter com quem comentar os absurdos da TV nos anos 90.

sábado, 1 de junho de 2024

A grama do vizinho não precisa ser a mais verde

 mas faça o favor de cuidar do seu quintal


    Alguns dias atrás, uma mulher veio aqui na loja e conversamos longamente sobre sexo e relacionamentos, até que ela me contou algo que achei incrível. Ela disse “todo mundo sempre acha a mulher dos outros mais bonita, mas eu decidi que comigo não seria assim. Depois de ter meu segundo filho, troquei todas as calcinhas feias por umas bem bonitas e eu provocava meu marido: saía sem calcinha e contava pra ele, pra ele ficar pensando nisso enquanto a gente tava fora de casa”. 

Essa foi a maneira que ela encontrou de se manter interessada e interessante. Um modo de deixar seu parceiro ávido por voltar pra casa com ela. Disse que funcionou muito bem! 

É claro que não podemos comparar a idealização de uma projeção com a realidade da pessoa com a qual convivemos todos os dias. O marido ou esposa dos outros parece mais interessante apenas porque não lidamos com as partes negativas daquela pessoa. Não vemos seus momentos de estresse pós trabalho, a bagunça que deixa na cozinha, o quanto gasta no cartão de crédito… o ônus de se conhecer intimamente alguém é também ficar íntima de todas as suas sombras.

Se lidar com os defeitos é algo inerente ao casamento, como podemos não nos deixar engolir pelo enfado da convivência?

Essa é mais uma daquelas situações em que, infelizmente, não há uma receita de bolo. Mesmo assim, suponho que posso recomendar uma coisa ou outra.

Pra começar, repare nos assuntos sobre os quais conversam. É claro que no meio da rotina há muita burocracia para resolver; dividir uma casa é igual ser sócio de uma empresa. O problema começa quando os casais só falam de coisa chata e esquecem de compartilhar interesses mais leves. Ficam presos num looping de boletos-mercado-filhos-tarefas, sem tempo para discutir filmes, música, arte, esportes, hobbies, astros ou sobre qualquer outra coisa que compartilhavam no começo da relação.

Analisa aí: sobre o que conversavam nos primeiros encontros? E sobre o que conversam agora? É um bom ponto de partida.

Agora, outra perguntinha capciosa: vocês se cuidam da mesma maneira que se cuidavam um para o outro no início? Já quero deixar bem claro que eu sei muito bem que é impossível estar montada, arrumada e depilada todo dia, não é sobre isso. A pessoa tem que se acostumar com a sua versão não produzida. Mas será que algumas coisinhas não podem ser ajustadas? 

Você precisa mesmo ter calcinha velha e furada na sua gaveta? Precisa mesmo dormir com pijama de bichinho que parece de criança? Tá, mas toda noite? Não tô te falando para usar lingerie sensual o dia inteiro, só pensa se você tem alguma peça que não deixaria a pessoa ver de jeito nenhum no começo do relacionamento. É com isso que você vai se apresentar depois de morar junto?

E pra alugar mais um triplex na sua cabeça, como você pode movimentar a imaginação e libido dos dois neste momento de vida? Com a minha cliente, funcionou sair sem calcinha. Com outra, eu sei que um vibrador com controle remoto fez sucesso. Também há quem deixe os filhos com os avós para ir pra balada ou pro motel, como faziam na época do namoro. E há quem não perca a oportunidade de mandar uma mensagem safada no meio do dia ou dar aquela passada de mão quando encontra a pessoa distraída.

O desejo é simples, o tesão é simples. Descubra o seu simples. E não é pra fazer isso só pra salvar casamento não, faça por você, pela sua libido. A libido é que nos tira da cama pela manhã e esses pequenos gestos vão impactar, mais do que tudo, a sua vida. O seu relacionamento é consequência.

 

Testa essas coisas e me conta? Eu só quero que você perceba que o prazer é todo seu.

 

Prazer é permissão

  Tá autorizada, ok? Antes de mais nada, ouso dizer que este texto é para mim, principalmente. Eu, tão liberta ao desfrutar os prazeres da...